Ana Rita e o unicórnio (Conto infantil)

Ana Rita e o unicórnio

Ana Rita, João e a avó encontram-se junto dos moinhos mesmo no centro da quinta e permanecem a olhar para o céu estrelado como que pasmados num longo, longo silêncio.

Silencio esse que é interrompido por passos de alguém que se aproxima:
“Tia Cláudia que bom voltar a vê-la! E trazes a Eva contigo”. Afirma João a pular e a correr para a senhora que se aproxima trazendo uma cadela pela trela. Pouco depois Ana Rita compreendeu que se tratava de uma cadela guia por a sua dona ser cega.

Cumprimentaram-se e abraçaram-se todos. Ana Rita só tinha ouvido falar mas ainda não conhecia pessoalmente esta tia cega de João. Cláudia é evidentemente filha da Eduarda a avó do João com quem temos estado.

Eva tem o pelo muito bonito e dá pulos de alegria por se achar em família talvez…

“Chamas-te Ana Rita não é? Fizeste um bom trabalho com o violino. Agradava-te fazer mais vezes o que fizeste nestes dois dias tocar e salvar uma estrela ferida?” Perguntou Cláudia.
“Claro que sim” Respondeu prontamente Ana Rita de olhos muito arregalados.
Vou explicar-te a ti e ao João o que se passou aqui:

“As estrelas são os mais antigos viajantes que conhecemos. Por vezes há acidentes. Podem chocar-se entre si. Podem ser atingidas por asteroides ou sofrer com as tempestades que assolam as galáxias. Quando estão feridas e desamparadas podem cair na terra, no mar ou em algum asteroide”.

“No mar existem as sereias. Elas têm o conhecimento para devolver intactas ao universo as estrelas que caiam na água. As sereias transportam as estrelas feridas para pequenas ilhas e depois com algas e cânticos conseguem curar definitivamente as suas feridas. As lendas falam-nos das sereias como uma perdição para homens e marinheiros. De facto são mas apenas porque o seu desígnio é o de curar estrelas e de lhes devolver a dignidade de poderem continuar a brilhar (sorrir) para nós”.

“Em terra existem muito poucos moinhos onde por perto alguém como tu toca violino de forma tão especial que as consegue curar. No espaço existe pelo menos um asteroide onde eu vivo e me dedico a curar estas estrelas acidentadas. Talvez um dia vos convide para me visitarem”.

Ana Rita resolve perguntar:
“Então isso quer dizer que o que fizemos hoje irá acontecer mais vezes e eu irei tocar violino para curar as estrelas que precisem de ajuda? É isso?”.

“Quase de certeza que sim Ana Rita. Só temos de fazer mais um teste. Para vós será uma brincadeira. Passa-me o violino”. E sendo cega Cláudia estendeu os braços esperando por sentir neles a presença do arco e do violino.

Assim que Cláudia sentiu o arco e o violino nas mãos, ajeitou a queixada a seu gosto e pediu a todos:
“Podem olhar para a parte do horizonte com mais estrelas por favor?” E começou a tocar uma linda toada doce e compassada.

A avó Eduarda, Ana Rita e João mal acreditam no que estão a ver. Um formoso unicórnio branco vem a galope desde o horizonte longínquo aproximando-se cada vez mais deles. O seu trote é veloz e majestoso. Ao chegar junto dos quatro o unicórnio baixa a cabeça provando alguma da erva que aqui cresce em abundancia. Enquanto isso Eva resolve correr e ladrar de contente ao redor do unicórnio.

Cláudia a tia de João resolve aproveitar para esclarecer:

“Os nossos antepassados já curavam as estrelas mas de outra forma. Aproveitavam a água em que bebiam e se banhavam os unicórnios para humedecer as feridas das estrelas, das pessoas e dos animais. Generalizou-se antão a caça a este ser puro, mítico e extraordinário. Como resultado agora existem muito poucos e apenas permitem ser tocados e montados por crianças. O Unicórnio é o único ser que consegue distinguir a pureza daquilo que aparenta ser puro.
“Experimenta subir para o dorso do unicórnio Ana Rita”.

E Ana Rita subiu para o dorso do unicórnio que a levou a trote pela pequena planície que acomoda os moinhos no cume deste monte. Ana Rita ficou assim a um nível mais alto do que o costume e pôde desfrutar de um passeio diferente e exclusivo. Ana Rita sentiu-se privilegiada por o unicórnio a ter deixado subir para o seu dorso coisa que já não é permitido aos adultos. Ana Rita ficou assim muita grata com este passeio com o unicórnio. De seguida João subiu também para o dorso do unicórnio e deixou-se passear por ele. Todos ficaram emocionados com este serão tão especial e inesquecível. Depois de tanto correr Eva resolveu rebolar pelo chão detendo-se cansada e ofegante mas contente por estar a viver esta aventura. Por fim João desmontou do unicórnio deixando-o pastar de novo pela erva à qual a noite acabara de espalhar mais frescura.
Ana Rita e João estavam extasiados de felicidade. Tinham muitas perguntas para fazer mas limitaram-se a viver todos estes momentos que os farão doravante sorrir para sempre talvez.

Embora Cláudia fosse cega tinha os restantes sentidos muito apurados e tinha de certeza uma grande intuição. A sorrir diz: “Olhem para o céu e vejam como está cheio de constelações em diálogo!”. E continuou:
“João e diz-me o que vês lá em cima…”
E o João responde:
“As estrelas estão maiores, muito luminosas, estão a sorrir… Olha vai ali uma estrela cadente…” Afirma João feliz.
“Então está na hora de eu ir andando. Essa e outras estrelas podem precisar da minha ajuda se caírem no meu asteroide”. Afirmou Cláudia.
“Então tia e agora como consegues regressar ao teu asteroide com o unicórnio e o teu cão guia assim no escuro?” Perguntou o João algo desconsolado.

“É fácil João eu, o unicórnio e Eva dirigimo-nos para um ponto algures no horizonte enquanto a tua amiga Ana Rita fica a tocar violino por mais dez minutos se ela não se importar”.
E desta forma com Ana Rita a tocar violino, Cláudia o unicórnio e Eva despediram-se de nós…



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